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  • Foto do escritorPatrícia Brito

Uma viagem pode conter toda uma existência, uma vida própria?


A viagem é uma das experiências mais ricas e íntimas que um ser humano pode realizar. Bens materiais, luxos e objetos, até mesmo livros, conquistamos, trocamos e carregamos apenas por um ápice. Tudo bem, que na parte dos livros, principalmente os físicos, eu e outros leitores, inclusive a própria autora de “Prana”, assumem os ciúmes de emprestar e tristeza quando precisa se desfazer de algum, mas o ser humano não é perfeito, tem defeitos e manias inexplicáveis. 


Agora, mais do que antes, nos tempos da COVID-19, que nos obriga ao isolamento social, reconhece-se e valoriza-se muito mais a aventura de viajar, percebendo a importância do conhecimento particular que uma única viagem pode proporcionar, eternizar e que cada ser humano carrega por toda uma vida. Esta oportunidade de se deslocar fica gravada na memória, ela pode até falhar para muitas outras coisas, mas viajar é uma lembrança e experiência que a alma guarda em um canto especial do cérebro. E o interessante… que é uma experiência individual, que somente você pode fazer por você. E, ao dialogar sobre, você narra seu ponto de vista sobre o local vivenciado.


Existem motivos e gostos pessoais ao escolher uma viagem. A viagem de luxo, a viagem de descanso, prazer e diversão; a viagem de estudo, viagem profissional; e a viagem de alma, para conhecimento interior, em uma geografia nova ou não. Não importa qual sua escolha ou missão para mover-se, o fato é que em todas criamos ligações, adotamos novas recordações e novas formas de viver.


Tem aqueles que têm medo, mas o ato em sim lhe faz tão bem, que você encara o desafio. E, quando chega ao destino, a energia muda, a felicidade se completa, sem uma explicação, apenas temos a vontade de vivenciar e curiosidade de conhecer cada local, sendo ou não turístico e histórico.


Jacqueline Farid confessou em recente bate-papo o temor de avião e outros receios de transitar entre um país ou entre uma cultura e outra. Achei interessante, pois me identifiquei e sei que muitas outras pessoas, também, se reconheceram nestes melindres. No momento atual, por exemplo, tanto a autora quanto eu não teríamos coragem de nos locomover para lugares que necessitem de transporte com aglomeração, mas todo apaixonado encontra uma alternativa. Menos audacioso, mais curto, porém sem deixar de respirar outros ares.


Em meus autorais ficcionais sempre trabalho isso com meus personagens, é uma forma de eternizar minha experiência ou de apresentar uma cultura.


Em “Prana”, uma obra ficcional, os capítulos têm formato de contos, por ser independente, porém percebemos que existem conexões entre um texto e outro, com uma narrativa de viagem e um ensaio da protagonista sobre a vida, ou sobre a morte.


Encontramos uma viagem mais íntima do que curiosa, na qual o lugar escolhido é um país com uma cultura e ritual diferentes de nós, ocidentais. Esta viagem íntima, em busca do “eu/identidade” ou o “eu/família”, é também uma viagem cheia de preciosidade revelada por onde “Prana” caminha.



Os pensamentos de Prana vagavam no passado e no futuro porque não sabia o que esperar de Khajuraho. Delhi era o ponto de encontro com a Índia


[…] De Agra nada sabia, mas Taj Mahal dispensava apresentação e por isso ela se alegrava pela oportunidade que teria. Bodhgaya fora grata surpresa apesar de ter […] apenas como pedra no caminho de Varanasi e esta, afinal, era o alvo da sua jornada […] (p. 117)


A primeira engenhosidade fica por conta do título que leva o nome da protagonista.

“Prana”, em sânscrito, significa “energia absoluta”; é o princípio de energia ou força, o princípio ativo da vida ou força vital. No yoga usamos o Pranayama, que é uma técnica que tem como objetivo a expansão da energia vital,


●     Prana = energia vital

●     Yama = expansão, movimento


O resultado final conduz naturalmente ao autocontrole e autoconhecimento. A autora revelou em uma Live (maio 2020 – com agência Oasys Cultural) que é adepta do Yoga fortalecendo, talvez, a escolha diferente do nome da protagonista, unindo yoga, o enredo e o espaço da narrativa.


A verdade é que realmente “Prana” é uma obra de muita energia e movimento, cujo título é apenas um detalhe da profundidade que essa história ficcional, às vezes, muito real, mostra no decorrer de cada capítulo.


É denso porque “Prana” está em busca de significados da morte de seu pai que, inusitadamente, faleceu na Índia. Tem humor, pois a personagem consegue se envolver em aventuras e, como toda viagem sem um “mico”, não fica divertido. Assim, “Prana” consegue fazer um trajeto sombrio com algumas doses humoradas e divertidas.


A história começa em Ouro Preto, revelando uma faceta familiar. Ser filha bastarda (como a própria protagonista repeti algumas vezes), trabalhar com o pai em negócios de pedras preciosas e ter uma relação familiar de altos e baixos. Por isso, aos 40 anos querendo entender a morte do pai, ela segue sozinha para a Índia.


Logo no início da viagem, que seria de autoconhecimento, as trapalhadas se revelam, e de sombrio acaba tornando uma experiência divertida e bem-humorada. Ser quase barrada no aeroporto internacional, acreditar 100% na internet ou em aplicativos, precisar sair fugida de uma cidade a outra, convencer uma agência de viagem a incluí-la na excursão com o pacote já fechado, é uma definição de ingenuidade com mulher forte e nada submissa. Um humor inteligente que causa, sim, bons sorrisos ao leitor.

A peregrinação pelos sinais da morte e corpo do então pai continua. Assim que pisa no aeroporto, a porta de entrada para a cultura hindu a faz ir em busca do desejado ao mesmo tempo em que passeia por uma cultura diferente.

[…] Prana viera de um lugar onde esmola não é generosidade a quem necessita e sim o pagamento voluntário para se livrar da culpa […] (p.137)

Na Índia “Prana” narra a mesma fé forte e dominante da sua cidade, Ouro Preto. Porém, por religião e hábitos bem diferentes.


O grande ápice da obra é que Jacqueline Farid cria uma ficção com tanta realidade de um povo. Os costumes, os hábitos, rituais, as cidades, os lugares visitados, tudo narrado em terceira pessoa – revela a verdadeira história da Índia.  Agra, Varanasi, Delhi, Rishikesh. Taj Mahal. Torre do Khalifa. Buda, fogo, cânticos, mantras. Histórias reais paralelamente à ficção e aventura.


Nos estudos e pesquisas biográfica e autoficção, autores e pesquisadores da área explicam a importância  de misturar narrativas. Mesmo que o livro não seja com todas as regras biográficas

[…] uma espécie de subproduto da História, um meio para o historicismo ou amostra para reflexões historiográficas […] (p. 19) – Sergio Vilas Boas

Ele, explicando sobre a importância de todos os gêneros que envolve a biografia, inclusive autoficção e, ainda continua,

[…] biógrafo sobrevive pelo que revela, não pelo modo como revela […] (p.19)

Portanto, Sim! Uma viagem pode conter uma vida própria. A prova são as viagens que transformam em livros.

Jacqueline Farid escolheu a ficção e por meio da protagonista “Prana” contou a história de um país exótico, de uma forma pela qual muitos livros biográficos ou escritores jornalísticos e até mesmo historiadores não conseguiriam contar. E isso é a consequência da junção dos estilos de narrativas. A escrita criativa brinca e proporciona oportunidade de misturar realidade e ficção por meio dos personagens.



Qual será o próximo livro viagem da Jacqueline Farid?

Ela, uma apaixonada confessa por viagens solitárias e de transformar suas vivências em grandes histórias, revelou que escreve novo autoral, que o leitor aguarda ansiosos qual a próxima cultura que ela irá explorar.



Jacqueline Farid é jornalista mineira, porém mora há 20 anos no Rio de Janeiro. Como jornalista já trabalhou em vários meios de comunicação. No momento que libero este conteúdo, ela atua como assessora de imprensa.

Como escritora, ela tem uma paixão de transformar suas viagens e experiências solitárias em ficção. “Prana” é seu segundo livro solo lançado pela Páginas Editoras. O primeiro livro em carreira solo foi no Reino das Girafas – pela editora Jaguatirica. Em breve falarei, também, desta narrativa ficcional – bem real de No Reino das Girafas


MAIS SOBRE PRANA

Lançamento: 2020

Páginas: 224



Por Patrícia Brito

Biógrafa e escritora ficcional da Academia Teixeirense de Letras.

Estudiosa da literatura e apaixonada por escrever ensaios e artigos literário.

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